Prof. Edna da
Silva Polese
A imagem criada por Julio
Cortazar para definir o romance poderia ser utilizada imediatamente após a
leitura de Tudo se Ilumina, de Jonathan Safran Foer, publicado em 2005.
Por teorizar que o romance puro não existe, mas, antes, apropria-se dos vários
recursos da linguagem Cortázar diz que: “O romance é um monstro, um desses
monstros que o homem aceita, alenta, mantém ao seu lado; mistura de
heterogeneidade, grifo transformado em animal doméstico.”
A narrativa de Tudo se Ilumina dá ao leitor a
sensação de que o monstro pode ficar cada vez mais esquisito. O romance está
dividido em três grandes blocos que se alternam, cada qual com um narrador
diferenciado, numa história que engloba a narrativa “de fora” feita por um
estrangeiro que domina muito mal a língua inglesa, uma saga familiar construída
com inspirações no realismo mágico e, por fim, os comentários sobre essa
escrita em formato epistolar. Tal composição nasceu da adaptação que o autor se
obrigou a fazer pela própria situação da realidade: Safran Foer é um jovem
judeu nova-iorquino que pretendia escrever a história de sua família num tema,
de certa forma, recorrente quando se pensa em judeus fugindo da Segunda Guerra na
Europa: perseguição, holocausto, desaparecimentos de pessoas e vilarejos
inteiros. Porém, o autor não conseguiu reunir informações suficientes para
“unir as duas pontas da vida”, mas a experiência da viagem funcionou como o
germe inicial para construir o romance.
A terceira narrativa é composta pelas cartas que Alexander
Perchov troca com o autor, o próprio Jonathan Safran Foer que, nesse sentido, é
também personagem do livro, assim com o é também na primeira narrativa. Nas
cartas, Alexander acompanha a construção da narrativa sobre Trachimbrod, a
segunda narrativa, comenta, sugere, e, às vezes se desentende com o autor . No
melhor estilo de narrativa metaficcional,
No fim, as três narrativas compõem uma razão de ser,
fecham-se numa idéia aproximada dos temas recorrentes do romance clássico: a
viagem, a experiência e a construção da memória. E, nesse sentido, Tudo se Ilumina surpreende com tema: é
uma narrativa que tem como assunto principal o holocausto, mas a maior parte do
tempo, o leitor não se dá conta disso, como se acompanhando passo a passo a
evolução da leitura e sendo obrigado a aceitar uma construção narrativa
surpreendente, perceba, entre um acontecimento e outro, como as existências,
coletivas e individuais, por algum motivo, se encontram.
***
Referências:
CORTÁZAR, Júlio. Notas sobre o romance contemporâneo
in Obra crítica 2. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1992.
FOER,
Jonathan Safran. Tudo se ilumina. Rio de Janeiro: Rocco, 2005
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