Prof.
Edna da Silva Polese
Ocorreu no
último dia 02 de abril, às 19:00 horas, na Livraria da Vila (Shopping Pátio
Batel) uma sessão de autógrafos e bate papo com o escritor Cristovão Tezza. Na ocasião, além de responder perguntas
acerca do sucesso do último livro, O
filho eterno, que ganhou notoriedade internacional, o escritor lançava o
novo romance, O professor. Fui ao
evento acompanhada por uma turma de alunos de Letras. Uma boa oportunidade de
ser ver, conhecer e principalmente ouvir o que o escritor tem a dizer sobre sua
obra. Muitas questões, discutidas em sala de aula estavam presentes, formuladas
de maneiras diferentes, é claro, sem aquele peso necessário da teoria e da
crítica que nos acompanha na vida acadêmica.
Ficaram marcante as informações sobre as
esperadas confusões entre autor e narrador, tão trabalhadas em sala de aula
quando discutimos essa relação bastante pertinente: o autor como entidade
física, a pessoa por trás da organização de uma obra fictícia, e o narrador,
aquele que “fala” de dentro do livro, expondo seu ponto de vista, suas
fraquezas e misérias, seu lado mais sombrio ou mais luminoso de ser humano.
Essa construção parece tranquila, mas ainda suscita dúvidas e questionamentos —
como ficou evidente entre as perguntas que o público e o jornalista lançavam ao
escritor. Cristovão deixou claro, por exemplo, que o protagonista e narrador de
O filho eterno é cruel, pois ele
representa uma mentalidade recorrente ainda na década de 1970 quando as
informações sobre a síndrome de Down, assim como as instruções de como criar um
filho nessa condição eram muito precárias. Nesse sentido, os trechos “difíceis”
da obra se justificam. O escritor ressaltou: “Não sou esse monstro do romance”
evidenciando que a obra, por mais que tenha sido inspirada em sua própria
história de vida — o autor tem um filho com síndrome de Down— não quer dizer
que o personagem que criou representa o que ele pensa sobre isso. Mais adiante,
brincou com a ideia de que os personagens cruéis são mais interessantes e que é
preciso criar circunstâncias em que a crueldade humana seja evidenciada, pois o
espaço romanesco propicia isso. Afinal, como nos ensina Antonio Cândido em “A
personagem do romance”, a ficção nos dá a possibilidade de conhecer um
personagem de maneira muito mais profunda que qualquer pessoa que conheçamos na
vida real, pois não temos acesso aos pensamentos dos outros. Assim, ao lermos
um romance, somos alocados para uma situação de conhecimento profundo sobre um
outro ser, diferente de nós e capaz, muitas vezes, de atos sombrios dos quais,
talvez, jamais teríamos capacidade de praticar. Veja o caso de Crime e castigo, de Dostoiévski, no qual
acompanhamos toda a performance do assassino e, mais adiante, o longo processo
de remorso e julgamento do crime cometido. Temos, assim, a oportunidade de
vivenciar todos os medos, angústias e sofrimentos de uma personagem.
Sobre o
romance novo, O professor, Cristóvão
informou que parte da construção
ficcional está embasada em sua própria vivência como professor universitário na
UFPR por vários anos, assim como a convivência com outros professores ajudaram
a montar o personagem fictício, representante direto do chamado mundo
acadêmico. Como o livro é novo, várias foram as perguntas acerca do processo de
criação, tanto da personagem principal, como das demais que povoam o romance.
Cristovão Tezza ainda está colhendo os frutos de seu livro mais famoso, O filho eterno, e contou como foi sua
visita à China, a recepção na universidade, o fato da obra ter sido
recentemente traduzida para o chinês. Questionado se a viagem inspirará algum
texto ou romance, o escritor simplesmente respondeu: “Não sei”. Segundo o
autor, não dá para saber de antemão o que será tema de um texto, um conto, uma
crônica ou um romance, pois tudo pode ser um tema. Tal resposta nos lembra o
que Julio Cortázar comenta no texto “Alguns aspectos do conto” em que mostra,
de maneira divertida, como as pessoas cercam a figura do escritor, contam uma
anedota interessante e ainda dizem ao escritor que vai lhe dar de presente
aquela pequena história para que ele a transforme num conto. Cortázar brinca
exatamente com essa ideia, pois o escritor é quem deve ser o primeiro a sentir
o impacto da narrativa, caso contrário, não saberá construí-la para seu público
leitor. Ao ouvir o escritor Cristovão Tezza comentando com geralmente se dá o
seu processo de criação, é possível ouvir essa voz de Julio Cortázar destacando
que não se sabe exatamente o que vai causar impacto no escritor e de cada um
tem o seu próprio método de criação do mundo e da personagem ficcional. Essas
informações nos ajudam a entender melhor esse processo criativo enriquecendo
nossa forma de analisar e perceber o texto ficcional.