O filme Contra
todos, de Roberto Moreira, expõe a violência sorrateira e cotidiana
explícita e implicitamente, com cenas de um almoço em família e de um
assassinato. A cor privilegiada é o vermelho, cor do mar (de sangue) que abre a
narrativa. Durante toda a história, o confronto se estabelece entre pessoas da
mesma comunidade e até da mesma família[1],
situação que reforça a crueldade, a competitividade e a individualidade. Isso
ocorre porque a violência ganha maior destaque, quando é praticada por pessoas
“iguais”, que compartilham interesses e convivem diariamente, intimamente. Mas,
em Contra todos, o individualismo não respeita laços e ultrapassa
qualquer obstáculo. De acordo com Bauman, isso ocorre porque a violência, como
resultado do apagamento de fronteiras provocado pela globalização, não conhece
mais limites e passou a ocupar espaços em que, antes, ela era proibida ou, pelo
menos, não tão frequente quanto é hoje em dia: “Um impulso violento está sempre
em ebulição sob a calma superfície da cooperação pacífica e amigável; esse
impulso precisa ser canalizado para fora dos limites da comunidade, onde a
violência é proibida. […] caso contrário desmascararia o blefe da unidade
comunal […].” (BAUMAN, 2001, p. 221).
Para acentuar esse “blefe da unidade comunal” a que o
autor se referiu, na passagem transcrita acima, o vermelho predomina, desde o
começo, com um mar de sangue sob o céu azul. Essa imagem ressurge depois, para
fechar o filme.
1 –
Capa do DVD Contra todos
Imagem
disponível em: http://www.adorocinema.com/filmes/filme-56936/
Em ondas menores, durante a história, o vermelho marca
presença, no figurino e no cenário. Várias vezes os personagens aparecem com
roupas de cor vermelha ou de seus matizes: rosa e bordô. O quarto de Cláudia e
Teodoro, o casal protagonista da história, tem colcha e almofadas bordô e os
móveis são todos de mogno. Na cozinha, um fogão vermelho, vários utensílios da
mesma cor e parte da parede pintada de rosa. Além disso, não são raras as cenas
que mostram a família à mesa. A devoração e o instinto também são explorados no
filme de Roberto Moreira.
2 –
A família reunida à mesa, com os amigos, e os tons de vermelho e seus
matizes
na cozinha da casa de Cláudia e Teodoro.
Imagem
disponível em:
http://www.tvsul.tv.br/wp-content/uploads/2012/08/Contra-Todos-Cineclube2.jpg
A violência, no filme de Roberto Moreira, é cotidiana,
está dentro de casa, e nas ruas. Em Contra todos, o conceito de “comunidade” é relativizado e atualizado.
A cidade é focalizada, a partir do cotidiano dos personagens. As cenas são
rápidas e combinam com as ações instintivas dos personagens. (...). Os
personagens não conhecem a contemplação e suas ações impensadas são cruéis,
violentas e sem aquela glamourização que o cinema pode produzir (e sem esse
recurso, a violência das cenas fica ainda mais evidente).
(Parte do
artigo intitulado A violência urbana no
cinema brasileiro contemporâneo, escrito pela Prof. Dra. Verônica Daniel
Kobs e publicado na revista Todas as
musas, ano 4, n. 2, 2013.)
[1]
Os personagens que têm função primordial no enredo do filme são os que compõem
o núcleo familiar (Teodoro (Giulio Lopes); Cláudia (Leona Cavalli), a segunda
esposa de Teodoro; Soninha (Silvia Lourenço), filha de Teodoro com a primeira
mulher) e também Valdomiro (Ailton Graça), que se relaciona com todos os
personagens do filme e que é também o melhor amigo de Teodoro.
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