COMO ESCREVER ROTEIROS?
MANDAMENTOS DE ROBERT
MCKEE
Brunilda
T. Reichmann, PhD[*]
Como
escrever um roteiro é uma das várias ideias exploradas na adaptação de The Orchid Thief [O ladrão de orquídeas], livro de Susan Orlean, publicado em 1998, e
adaptado para o cinema em 2002, por Charles Kaufman, com o título Adaptation [Adaptação]. Considerando a metaficcionalidade do filme – a ansiedade
que toma conta do personagem roteirista ao tentar adaptar para o cinema um
livro “sobre flores” – e parodiando Harold Bloom, poderíamos sugerir a
expressão “The Anxiety of Adaptation” como um título bastante apropriado para o
filme, pois revelaria a moldura externa e grande parte do enredo; no entanto,
podemos argumentar também que o título empregado está de bom tamanho, pois é
mais abrangente, expandindo assim a expectativa do receptor. O fato é que o
título do filme é apenas Adaptação,
mas narrativiza no cinema, não apenas o texto de O ladrão de orquídeas, mas o angustioso processo pelo qual passa o
roteirista ao tentar adaptar artisticamente um texto para a tela.
A
Charles Kaufman [roteirista norte-americano, interpretado por Nicholas Cage],
protagonista do filme, homônimo do roteirista norte-americano, é oferecida a
tarefa de adaptar para o cinema o livro O
ladrão de orquídeas, de Susan Orlean [escritora norte-americana,
interpretada por Meryl Streep]. Outro roteiro de Kaufman, Being John Malkovich [Quero
ser John Malkovich], estava sendo filmado com relativo sucesso, mas, ao
tentar adaptar O ladrão de orquídeas,
Kaufman, o protagonista e roteirista fictícios,
passa horas diante da máquina de escrever olhando para uma folha em branco,
tomado pela paralisante ansiedade de querer adaptar um livro “sobre flores” para
o cinema, sem utilizar fórmulas feitas ou clichês da indústria cinematográfica,
menosprezados por ele como the Hollywood
“thing”. No desenrolar da trama do filme, o irmão gêmeo do protagonista,
Donald Kaufman, também interpretado por Nicholas Cage, decide que irá escrever
um roteiro e o faz sem grandes dificuldades depois de frequentar um minicurso
de três dias, intitulado “Como escrever roteiros”, oferecido por Robert McKee. Donald
adere totalmente aos dez mandamentos do professor do minicurso e aos modelos
dos filmes de sucesso de Hollywood. Oito dos dez mandamentos podem ser lidos antes
de serem arrancados, por Charlie, da parede sobre sua escrivaninha onde Donald
os afixara. A linguagem é arcaica, imitando assim o estilo dos mandamentos
bíblicos. Diferentemente dos mandamentos bíblicos, no entanto, os mandamentos
do roteirista contêm apenas três proibições, os outros cinco mandamentos visualizados
são afirmativos:
1.
Você
deve respeitar sua audiência.
2.
Você
deve pesquisa sobre o assunto.
3.
Você
deve dramatizar a exposição.
4.
Você
deve colocar um assunto em cada texto.
5.
Você
deve criar personagens complexos, ao invés de meramente complicar a história.
6.
Você
não deve usar mistério artificial nem surpresa banal.
7.
Você
não deve usar deus ex-machina para chegar ao seu final.
8.
Você
não deve facilitar a vida para o/a protagonista.
Esses
mandamentos são uma “reedição” dos mandamentos que McKee, conhecido professor
de roteiros norte-americano, utiliza em suas aulas. Ainda outros mandamentos são
explicitamente abordados pelo professor, no filme, ao falar sobre a criação de
uma narrativa: não usar o recurso de voice
over para revelar pensamentos de personagens (recurso utilizado desde o
início do filme Adaptação) e não criar
um protagonista apático (que estaria vinculado ao 5º mandamento e seria a característica
primordial do protagonista de Adaptação).
Os dez mandamentos de McKee são elaborados da maneira que segue:
1. Você não deve tirar a crise/o ponto culminante das mãos do protagonista.
O mandamento anti-deus ex-machina.
2. Você não deve facilitar a vida para
o/a protagonista. Não há progresso em história sem conflito.
3. Você não deve incluir exposição pela exposição. Dramatize-a. Converta
exposição em munição.
4. Você não deve usar mistério artificial ou surpresa banal.
5. Você deve respeitar sua audiência. O mandamento “anti-picaretagem”.
6. Você deve conhecer seu mundo como Deus conhece o nosso. O mandamento
pró-pesquisa.
7. Você não deve complicar, mas sim tornar mais complexo. Não multiplique as
complicações em um único nível. Use todos os três: intrapessoal, interpessoal e
extrapessoal.
8. Você deve atingir o fim da linha, levando as personagens aos conflitos
mais longínquos e profundos imagináveis dentro do reino da probabilidade da
história.
9. Você não deve escrever “nas coxas”. Insira um subtexto em cada texto.
10.
Você deve reescrever.
Donald,
o escritor fictício que segue os mandamentos do professor, discute, várias
vezes, sobre as técnicas que utilizará para escrever seu roteiro com o irmão
Charlie, que o critica severamente. O
roteiro de Donald, The 3, no entanto,
ao ser finalizado e entregue ao produtor de Charlie, é elogiado e indicado para
ser produzido. Possivelmente os mandamentos de McKee ainda continuem fazendo sucesso
entre espectadores...
[*] Brunilda Reichmann, PhD, é Professora
Titular da Pós-Graduação em Letras da UNIANDRADE.
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