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segunda-feira, 8 de outubro de 2012

CURITIBA ZERO GRAU: A PREVISÃO É DE TEMPO BOM.

Verônica Daniel Kobs*

Na semana de estreia do filme, apesar de a produtora e o diretor do filme terem considerado o filme uma produção “não bairrista”, foi justamente o fato de o filme ser curitibano que repercutiu, nas entrevistas veiculadas em programas culturais e também nas propagandas de rádio. Como curitibana, boa provinciana e apreciadora de cinema, fui conferir o filme e confesso que esperava algo “para turista ver”.
Evidente que o bairrismo existe: o espaço curitibano está lá, como cenários de quatro histórias e de quatro personagens, assim como o sotaque tão particular de quem é de Curitiba e fala “piá” e “leite quente”. Por isso, o espectador curitibano tem uma relação especial com o filme. Eu gostei de ver um modo de falar diferente dos sotaques carioca e paulista e me surpreendeu, em muitos sentidos, a qualidade técnica do filme, que é uma produção a altura das grandes produções. Não foi à toa que o longa, antes de ser exibido nos cinemas, em todo o Brasil, participou do Festival de Cinema do Rio, em 2010, e, em 2011, conquistou o prêmio do público, no Cinesul.
O filme impressiona pela simplicidade das histórias, cotidianas e universais, que refletem muitos dos problemas do novo século. Em algumas críticas sobre o filme, li que “Curitiba zero grau fala da sobrevivência nas grandes cidades”. Verdade. E isso me fez pensar sobre a relação já anunciada no título, entre o filme curitibano e o polêmico Rio 40 graus, dirigido por Nelson Pereira dos Santos e lançado na década de 1950. A semelhança é o entrelaçamento de histórias de personagens que têm de tratar de ganhar a vida na capital. A diferença é a temperatura.
O frio curitibano está em várias paisagens de inverno do filme, a mais bonita delas no Parque Barigui. Mas se engana quem pensa que a produção elege só os cartões postais da cidade como cenário. Não mesmo. Acompanhando a história, vamos da Cidade Industrial ao Centro, depois ao Rebouças, ao Jardim Ambiental, ao Boa Vista e chegamos ao bairro Santa Cândida... Nossa cidade está lá, com a modernidade e os projetos urbanísticos que os turistas querem ver de perto, com os grandes parques, mas também com favelas, pequenas praças e vilas (anônimas para muitos), conjuntos residenciais populares... Espaço e identidade são ampliados, multiplicados, e são o lado bom do filme de Eloi Pires Ferreira.  
Quanto ao outro lado, claro que há tentativas de acerto, mas que não atingem plenamente o objetivo. Durante todo o filme, acompanhamos as histórias dos quatro protagonistas. Esse esquema de enredos paralelos sempre requer algum cuidado e exige uma escolha difícil: diminuir a intermitência narrativa, usando um espaço mais longo para cada história; ou investir na rapidez e na descontinuidade, com trechos mais curtos de cada narrativa. O ideal mesmo seria conseguir um equilíbrio, justamente o que faltou em Curitiba zero grau. Percebemos essa falha no final, quando os personagens se encontram e as histórias são retomadas. Mas alguns detalhes ficaram longe... O espectador já tinha até se esquecido deles. Resultado: A intensidade do problema não é retomada no mesmo nível de ansiedade e expectativa que havia no momento em que a história daquele personagem foi contada, lá no início.
Além disso, o cinema atual nos condiciona a esperar finais pouco otimistas e Curitiba zero grau contraria essa tendência. A isso se deve a frustração que tive (ainda que acompanhada de uma pequena dose de surpresa) com o final do filme: Tudo dá certo e o que não dá certo revela o bom caráter dos personagens. De um modo ou de outro, depois do frio, o sol volta a aparecer para todos. Pelo menos, o fim da história é coerente com o otimismo do trailer do filme...
Em Curitiba zero grau, a previsão é de tempo bom. Temperatura amena, com sol entre nuvens: uma paisagem tipicamente curitibana.

FICHA TÉCNICA DO FILME: CURITIBA zero grau. Direção de Eloi Pires Ferreira. BRA: Produzido e distribuído por Tigre Filmes e Camarada Filmes; 2012 (105 min); son.

* Verônica Daniel Kobs é professora de Imagem e Literatura do Curso de Mestrado em Teoria Literária da Uniandrade.




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