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segunda-feira, 4 de maio de 2015

FILOSOFIA E LITERATURA: APROXIMAÇÕES



Paulo Eduardo de Oliveira*

As relações entre Filosofia e Literatura parecem ocupar lugar de destaque ao longo da História do Pensamento Ocidental. Dos Filósofos Pré-Socráticos aos pensadores contemporâneos, a História da Filosofia está repleta de exemplos típicos dessa relação: há casos de autores oriundos da Literatura e que, por meio dos seus textos, produzem profundas reflexões filosóficas como Homero, Cícero e Shakespeare, por exemplo; e, de outro lado, há casos de autores oriundos da Filosofia que, ao tentarem expressar sua filosofia, se utilizam dos recursos das artes literárias (como Platão, Santo Agostinho, Sartre).
Deve-se considerar, ainda, que a relação entre Filosofia e Literatura aparece também no fato de a própria linguagem ser tomada como objeto de análise por parte da Filosofia. Desde Platão e Aristóteles, na Idade Antiga, passando por Santo Agostinho e Tomás de Aquino, na Idade Média, e depois com os filósofos modernos, principalmente com Descartes, a linguagem sempre ocupou espaço próprio na reflexão filosófica, dada a sua importância como instrumento de expressão do pensamento. Mais recentemente, essa relação se tornou ainda mais explícita ao se fundar um ramo da Filosofia próprio para a análise e a reflexão da linguagem: a Filosofia da Linguagem. Com pensadores como Frege, Carnap, Wittgenstein, Adorno e Horkheimer, por exemplo, a reflexão filosófica sobre a linguagem em geral (e sobre a Literatura, de modo particular) ganha especial relevo.
A tênue relação entre ambas as disciplinas precisa ser analisada com atenção e cuidado, para que não haja sombreamentos que prejudiquem a compreensão do que é específico em cada uma dessas distintas áreas do saber. Atualmente, a abordagem interdisciplinar tende a orientar a forma como as pesquisas vão sendo construídas. Neste contexto, importa considerar o que é comum a diferentes áreas do saber e, ao mesmo tempo, o que é próprio de campo específico. No caso da Filosofia e da Literatura, sob um olhar de primeira vista, pode-se considerar que ambas têm em comum o uso preferencial dos recursos da linguagem para expressar suas produções, ideias, concepções e referenciais teóricos. Ambas são disciplinas “discursivas”, no sentido lato do termo. Por outro lado, a Literatura se utiliza de alguns “tipos” próprios de expressão textual que nem sempre cabem a alguns campos do saber filosófico: isso se dá, sobretudo, quando os conceitos ou elementos teóricos da Filosofia exigem um tratamento mais formal ou objetivo, como é o caso da Filosofia da Ciência e da Lógica, por exemplo.
A importância da análise das relações entre Filosofia e Literatura se mostra ainda mais evidente no que se refere à compreensão de como se dão os processos de construção da “subjetividade” e das “políticas” (relações de poder) que se manifestam em torno das expressões da subjetividade. Como expressão da interioridade do sujeito, a subjetividade (como o termo mesmo denota) não se rende facilmente aos meios “objetivos” ou às formas “objetivantes” de manifestação. Ao contrário, a subjetividade mostra-se cada vez mais autônoma em relação ao projeto moderno de uma visão objetiva capaz de dar conta da explicação do real.
A Filosofia Contemporânea desenvolveu-se a partir da crítica do pensamento moderno, cujo principal propósito é a construção de uma perspectiva objetiva (veja-se, por exemplo, o ideal do “cogito” cartesiano e a proposta do positivismo de Augusto Comte como expressões do projeto moderno de objetivação da visão de mundo). Contudo, com o desenvolvimento da Fenomenologia, a partir do século XIX, e com o surgimento da filosofia crítica (da Escola de Frankfurt) e o aparecimento do Existencialismo, a filosofia inicia um processo de abandono do ideal de objetivação do mundo. Passa-se a adotar uma perspectiva antimoderna, que vai culminar na tendência chamada de “pós-modernidade”. Tal tendência privilegia o foco da subjetividade, dando maior atenção à manifestação da interioridade humana naqueles elementos de difícil redução a uma forma lógica e objetiva de expressão.
Mais do que conflito ou simples distanciamento, o que a história do pensamento revela é que Filosofia e Literatura estão em constante movimento de aproximação e diálogo.

* Paulo Eduardo de Oliveira é Doutor em Filosofia e Professor do Mestrado em Teoria Literária do Centro Universitário Campos de Andrade, em Curitiba.

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